sábado, 31 de maio de 2014

Acidentes de Trabalho

Caros leitores,

        O tema de hoje é bastante interessante e sensibilizante, vou falar-vos sobre acidentes de trabalho. Não só é um tema que contacto todos os dias no meu estágio, fazendo sensibilização aos clientes, como também porque fiz uma caracterização de um acidente de trabalho. O acidentado em questão trabalha numa indústria panificadora e a causa do acidente foi a má postura na movimentação de cargas, neste caso, de uma saca de farinha (30kg).
Fig.1 - Movimentação de carga incorreta
Os acidentes de trabalho constituem um problema a nível nacional, europeu e mundial, com consequências económicas e sociais graves 1. O elevado número de acidentes, incluindo os acidentes mortais, resulta em custos para os países, para as organizações e em consequências graves para a saúde e bem-estar da população. Constituem um problema de Saúde Pública fundamental para todos os que intervêm no trabalho/emprego, desde os trabalhadores aos sindicatos, passando pelos empregadores bem como pelas seguradoras e pelo Estado.
Na União Europeia (UE), segundo estatísticas publicadas pelo EUROSTAT2, morrem, anualmente, 5 720 pessoas na sequência de acidentes relacionados com o trabalho. Além destes, e segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) 3, na UE ainda morrem anualmente 159 500 trabalhadores devido a doenças ocupacionais. Por conseguinte e tomando os dois números em consideração, a cada três minutos e meio morre alguém na UE devido a causas relacionadas com o trabalho. A maior parte destes acidentes e doenças é evitável. Estima-se que estes acidentes custam à UE cerca de 20 mil milhões de euros. Segundo dados do Eurostat, 4% da população ativa de Portugal é anualmente sujeita a acidentes de trabalho 4, sendo este considerado um valor bastante elevado. Acidentes e doenças profissionais podem dar origem a pesados custos para a empresa, sobretudo pequenas empresas. A prevenção das doenças, dos acidentes e incidentes de trabalho tem mais benefícios do que apenas reduzir danos: também foi demonstrado ser um fator contributivo para melhorar o desempenho das empresas.
Fig.2 - Caricatura de um acidente trabalho mortal

Muitas destas vidas poderiam ser salvas se os riscos fossem antecipados e se fossem implementadas, e rigorosamente seguidas, medidas de segurança. A Segurança e Saúde do Trabalho é uma matéria que, por lidar diretamente com vidas humanas, não pode nunca ser descurada, sendo também esse o pressuposto por detrás do enquadramento legal que a regulamenta. O Código do Trabalho 5 e a Lei nº 3/2014 6 definem as obrigações das empresas em matéria de segurança e saúde do trabalho, assim como as atividades a desenvolver nas empresas nas vertentes da prevenção de riscos profissionais. Estes diplomas regulamentam, igualmente, a estrutura dos serviços de segurança e saúde do trabalho.
Para evitar que novos acidentes de trabalho ocorram e não apenas para que se encontre um culpado, é fundamental que todos os acidentes sejam analisados. Todos os acidentes acontecem por alguma razão - eles não acontecem por acaso. Se for feita uma análise adequada, podemos identificar as causas dos acidentes, e poderá ser tomada alguma medida para as eliminar e impedir que outro acidente como aquele se repita.
A análise estatística dos acidentes de trabalho é uma das metodologias de controlo mais utilizada para a compreensão dos índices de sinistralidade, pois permite um conhecimento efetivo da sinistralidade laboral, a análise criteriosa dos acidentes e a consequente definição de prioridades no controlo dos diferentes riscos. Sendo a análise de acidentes de trabalho uma fonte de informação primordial, permitirá posteriormente definir planos de ações corretivas e promover uma política de prevenção dos riscos profissionais, com vista a melhorar as condições de segurança e saúde dos trabalhadores.


Causas

Os acidentes de trabalho são causados por determinados riscos associados ao exercício da atividade profissional e atuam de forma inesperada e violenta, por vezes provocando lesões que se tornam visíveis no momento.
O acidente é, na maioria senão na totalidade das situações, o resultado de uma combinação de fatores técnicos, fisiológicos e psicológicos: relaciona-se simultaneamente com a máquina, o meio ambiente, as condições ergonómicas em que a tarefa é realizada e com a fadiga devida ao próprio trabalho. As causas de um acidente podem igualmente estar ligadas às circunstâncias em que se efetua o trajeto ou deslocação entre a habitação e o local de trabalho, às atividades extra laborais, ao humor (bom ou mau) ou ao sentimento de frustração, a doenças profissionais, à exuberância da juventude ou qualquer outro estado físico ou mental particular. 7
Não é surpreendente a atual preocupação crescente com os riscos de acidente inerentes ao comportamento humano, seja na fábrica ou outro local, e que se examinem agora os problemas de proteção da saúde e do bem-estar do trabalhador de um ponto de vista global, excluindo qualquer fracionamento por razões puramente administrativas.


Definição Legal de Acidente de Trabalho

É descrito pelo n.º 1 do artigo 6º da Lei n.º 100/97 de 13 de Setembro8 o conceito de acidente de trabalho: “É acidente de trabalho aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza direta ou indiretamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte a morte ou redução na capacidade de trabalho ou de ganho.”

Participação dos Acidentes de Trabalho
Após a ocorrência de um acidente, este deve ser participado:
  • À entidade empregadora ou à pessoa que a represente na direção do trabalho pelo sinistrado ou os beneficiários legais de pensões nas 48 horas seguintes;
  • À empresa de seguros pelas entidades empregadoras que tenham transferido a sua responsabilidade;
  • Ao tribunal competente pelas entidades empregadoras cuja responsabilidade não esteja garantida na forma legal, independentemente de qualquer apreciação das condições legais da reparação.

O prazo para a participação é de 8 dias contados a partir da data do acidente ou do seu conhecimento.
O empregador deve comunicar à ACT 9, no prazo máximo de 24 horas, não só os acidentes de trabalho de que resulte a morte ou lesão grave do trabalhador, mas também os eventos que assumem particular gravidade na perspetiva da segurança e saúde do trabalho. Nos casos de morte, o acidente deverá ser participado de imediato ao tribunal competente, por telecópia ou outra via com o mesmo efeito de registo escrito de mensagens, sem prejuízo do disposto nos números anteriores.
As entidades seguradoras devem remeter ao Departamento de Estatística do Ministério do Emprego e da Segurança Social, até ao dia 15 de cada mês, um exemplar de cada uma das participações de acidentes de trabalho que lhes tenham sido dirigidas no decurso do mês anterior. 11

Quadro 1 Acidentes de Trabalho em Portugal – evolução de 2000  a 2010 (GEP, 2012b)13
Gráfico 1 - Taxa de incidência de acidentes de trabalho, médias 1994-96 e 2002-2004
O gráfico 1 permite comparar a evolução da sinistralidade no trabalho para os 15 países da UE, considerando as médias dos períodos 1994-1996 e 2000-2004. Portugal segue a redução observada no conjunto dos 15, embora se encontre ainda com uma taxa de sinistralidade superior à maioria dos restantes países membros da UE a 15.
Uma das exceções é constituída pela Espanha que, de resto, viu agravar-se a sua taxa de incidência entre os dois períodos considerados. De qualquer forma, a situação em Portugal não é muito diferente da observada nalguns dos países mais avançados da União Europeia, como é o caso da França ou da Alemanha.
Para quem quiser saber mais para cada país em particular, pode verificar os acidentes e mortes no trabalho do mundo em: http://www.segurancanotrabalho.eng.br/estatisticas/estacidmundo.pdf

Gráfico 2 – Acidentes de Trabalho em Portugal: total e por setor de atividade económica 12
 
Gráfico 3 - Taxa relativa de incidência setorial de acidentes na região de Lisboa, 2003 

        Fazendo uma análise comparativa entre o gráfico 2 e 3 a caracterização do acidente de trabalho realizada a uma panificadora no decorrer do estágio, pode-se concluir que é no setor de indústrias transformadoras que ocorre maior acidentes de trabalho. Por exemplo, no ano 2011 ocorreram 54.611 acidentes de trabalho (gráfico 1) e 74,1% na indústria alimentar (gráfico 2). Este números são extremamente preocupantes, principalmente ao nível das indústrias transformadoras e na construção, pois é onde apresentam números mais elevados de acidentes de trabalho.

Segundo a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) 9 o número de mortes no trabalho caiu de 163, em 2007, para 120, em 2008, mas “a crise pode aumentar o risco de acidentes”, reconheceu o Coordenador Executivo para a Promoção da Saúde e Segurança no Trabalho, da ACT, dado uma eventual quebra no investimento na prevenção e na segurança e a deficiente formação de alguns trabalhadores contratados menos qualificados ou com algum stress por verem os seus empregos em risco.
No decorrer do estágio tenho presenciado esta realidade todos os dias, os clientes e trabalhadores queixam-se da falta de verbas em todos os setores, acabando por diminuir o investimento ao nível da Higiene e Segurança no Trabalho (HST). Muitos deles contratam empresas de HST de baixo custo e sem certificação, enquanto outros reduzem os contratos para o mínimo. Mantêm a empresa somente porque é um requisito legal, despreocupando-se em melhorar as condições de trabalho dos trabalhadores.
As exigências são muitas, principalmente ao nível das pequenas empresas. Na situação em que se encontra o país, os empregadores vêm-se em risco de ter que fechar o estabelecimento, reduzir o número de trabalhadores ou ano-após-ano não precedem a alterações de não-conformidades. Como futura Técnica de Saúde Ambiental é desmotivadora esta realidade. As vistorias realizadas no Grupo CentralMed são realizadas anualmente e no contacto que tive com os clientes e com os Técnicos de HST, a maior parte das vezes não surge nenhuma alteração desde o ano anterior.

        É essencial prever os riscos, pôr em prática medidas eficazes de segurança e assegurar o seu seguimento rigoroso. Investindo na formação/informação aos trabalhadores, de modo a consciencializá-los dos riscos profissionais a que estão sujeitos, bem como as medidas preventivas a adotar para prevenir os acidentes de trabalho.

Até à próxima publicação!


Referências Bibliográficas:

1 - European Agency for Safety and Health at Work (EASHW), 2002; International Labour Organization (ILO), 2003.
2 – EUROSTAT
4 - Soares et al., 2005
6 – Diário da República Eletrónico. Lei nº3/2014, de 28 de Janeiro 
10 - Belloví, Manuel, Malagón, Francisco, “NTP 330: Sistema Simplificado de Evaluación de Riesgos de Accidente”, Centro Nacional de Condiciones de Trabajo, INSHT, Barcelona,1993
12 – PORDATA - Acidentes de Trabalho em Portugal: total e por setor de atividade económica

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Consulta aos Trabalhadores

Caros leitores,

Ao longo deste estágio tenho feitos imensas vistorias a escritórios (trabalho de caráter administrativo), mas todas elas com uma finalidade diferente, ora uma avaliação de riscos, uma vistoria anual, medidas de autoproteção, informação ou consulta dos trabalhadores. Esta publicação é dedicada à consulta aos trabalhadores. Fiz uma vistoria a um escritório com cerca de 25 trabalhadores com trabalho permanentemente sentado e com equipamento dotado de visor, adoção de posturas de trabalho incorretas e iluminação insuficiente/inadequada. Todos estes parâmetros foram tidos em consideração para cada posto de trabalho, informando cada trabalhador das alterações que deverão adotar.
Consultar os trabalhadores atempadamente sobre diversas matérias de segurança e saúde no trabalho, respeitar o direito de apresentarem propostas e dar-lhes a oportunidade de serem parceiros no processo de construção das decisões deve fazer parte duma estratégia da organização que permita valorizar os conhecimentos e a experiência dos trabalhadores, incentivar a sua motivação e o seu envolvimento e construir a melhoria contínua.
Fig.1 - Caricatura de checklist
Foi publicada a Lei nº 3/2014 de 28 de janeiro 1 (em vigor desde 27 de fevereiro de 2014), que procede à segunda alteração ao regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho, aprovado pela Lei n.º 102/2009 de 10 de setembro cuja primeira alteração foi introduzida pela Lei nº 42/2012 de 28 de agosto 2, em matéria de segurança e saúde no trabalho. Conforme o artigo 18º nº1, a consulta aos trabalhadores que era feita pelo menos duas vezes por ano por escrito, passa a ser pelo menos uma vez por ano. Esta consulta visa obter o parecer dos representantes dos trabalhadores, ou na sua ausência, de todos os trabalhadores. A consulta não implica o compromisso de aceitação do parecer, até porque à entidade empregadora é reservado o direito de recusa justificada, em quatro dos doze itens objeto de consulta, mas é desejável que conduza a uma situação de decisão conjunta, sendo um meio para garantir a exequibilidade dos princípios gerais da prevenção. Ainda que os requisitos legais sobre a consulta dos trabalhadores sejam apresentados num único artigo, o processo não pode ser posto em prática isoladamente dos restantes princípios gerais do sistema de prevenção.
Segundo a Diretivan.º 89/391/CEE, de 12 de junho, no artigo 11.º sobre consulta e participação dos trabalhadores, faz recair sobre as entidades patronais a obrigação de consultar os trabalhadores e/ou os seus representantes e possibilitar a sua participação em todas as questões relativas à segurança e à saúde no local de trabalho.3 A obrigação implica a consulta dos trabalhadores, o direito dos trabalhadores e/ou os seus representantes apresentarem propostas e a participação equilibrada de acordo com as legislações e/ou práticas nacionais. Aos representantes dos trabalhadores com funções específicas em matéria de proteção da segurança e da saúde dos trabalhadores são conferidos os direitos de pedir à entidade patronal que tome as medidas adequadas e de apresentar propostas nesse sentido, de modo a minimizar qualquer risco para os trabalhadores e/ ou a eliminar as fontes de perigo.
How to convey OSH information effectively: the case of dangerous substances, (Eu-Osha,2003a) compila exemplos dos benefícios da consulta dos trabalhadores e, de como os trabalhadores ao nível da empresa podem ser incluídos no processo de comunicação e podem ser encorajados a sugerir melhorias. A título de exemplo, numa reunião de consulta com os trabalhadores, na Glanbia Ingredients (Irlanda) a sugestão de um trabalhador para a remoção do sistema de dosagem de cloro gás por um sistema de dosagem simples de hipoclorito de sódio líquido foi tida em consideração, analisada com outros trabalhadores e com a gestão e por fim foi aplicada no local de trabalho. Nas reuniões de consulta os trabalhadores são encorajados a propor as suas ideias num registo informal.4
Fig.2 - Caricatura de Informação/consulta aos trabalhadores
Independentemente de consultar os trabalhadores ser um requisito legal, a literatura atribui-lhe um caráter benéfico para a cultura de prevenção da empresa, pois o comprometimento e envolvimento das partes, trabalhadora e empregadora são imprescindíveis para a eficácia do sistema de gestão da prevenção.
Os trabalhadores através dos seus conhecimentos de saber-fazer auxiliam na identificação de riscos e a sua participação permitirá alcançar o sucesso desejável na implementação de medidas de cariz corretivo e/ou preventivo.
Num dos lados, o empregador visa a maximização dos lucros e portanto, todos os custos decorrentes da reparação de acidentes de trabalho e quebras de produtividade devem ser evitados, tal implica que tenha uma gestão bastante eficaz da prevenção e que obviamente tenha uma força de trabalho motivada. No outro lado, os trabalhadores procuram condições dignas de trabalho na finalidade da preservação da integridade física e mental e conhecem, ainda que, sob o ponto de vista empírico, o que fazer para assegurar o direito à vida.
O filme Napo em…juntos na segurança!, foi selecionado por ser um recurso didático de linguagem universal, com um leve toque humorístico que confere destaque ao comportamento e à cultura no sistema de prevenção. A cooperação entre empregador e trabalhadores pode resultar na criação de um local de trabalho mais seguro, produtivo e saudável. O filme aborda também a liderança, o papel da gestão em promover a segurança e saúde no trabalho pelo exemplo de empenho e respeito.5

Os inúmeros referenciais técnicos internacionais publicados por organismos e organizações de segurança e saúde no trabalho confirmam a importância atribuída à consulta dos trabalhadores e o empreender das entidades oficiais na dinamização da sua eficiente prática. A consulta deixa de ser vista como uma peça solta do puzzle da prevenção e passa a ser considerada naturalmente em todos os aspetos de gestão, em primeira instância, sempre que a Lei assim o estabeleça, mas também como meio de promoção da cooperação no local de trabalho, numa estratégia proactiva.
A consulta dos trabalhadores como compromisso de colaboração mútua entre as partes da relação laboral deve ser percecionada como um meio de obtenção de soluções para os problemas da organização e ter recursos humanos motivados. Vários autores são unanimes em considerar que os trabalhadores não podem ser meros recetores de ordens, mas sim agentes interventivos.
A título de exemplo deixo-vos um questionário com algumas questões que poderão constar num modelo de uma consulta aos trabalhadores no âmbito da higiene, segurança e saúde no trabalho:

Até á próxima publicação!

Referências Bibliográficas:
4 - EU-OSHA How to convey OSH information effectively: the case of dangerous substances.
Edtion ed.: Office for Official Publications of the European Communities, 2003a. ISBN
9789291910441

domingo, 18 de maio de 2014

Medidas de Autoproteção

Caros leitores,

Esta publicação é dedicada às medidas de autoproteção, muitos de vocês já devem ter ouvido falar. Eu, pessoalmente só aprofundei os meus conhecimentos nesta temática desde que estou no estágio, confesso que era um pouco confuso para mim recolher e analisar todos os dados e calcular a respetiva categoria de risco da utilização-tipo de acordo com a Portaria nº1532/2008, de 29 de Dezembro. Atualmente já estou mais familiarizada e já realizei diversas vistorias no âmbito da elaboração das medidas de auto-proteção.1
As Medidas de Autoproteção devem ser entregues no Centro Distrital de Operações e Socorro (CDOS-ANPC):
·         Até aos 30 dias anteriores à entrada em utilização do espaço, no caso de obras de construção nova, de alteração, ampliação ou mudança de uso;
·         No caso dos edifícios e recintos existentes, a implementação deve ser imediata.
Fig.1 - Caricatura de
proteção contra incêndios
em edifícios 
4
Uma situação de emergência, ocorrendo de forma imprevista, não esperada ou controlada, representa um risco imediato, quer para a saúde, bem–estar, ou vida das pessoas diretamente envolvidas, quer para o património ou meio ambiente circundante ao local da sua ocorrência ou manifestação. A maior ou menor capacidade de resposta a uma situação desta natureza determina níveis diferenciados de consequências e impactos sobre o ser humano e meios/recursos materiais e ambientais envolvidos.
De entre as situações de emergência mais descritas e regulamentadas, do ponto de vista histórico, social, e económico, destaca-se o fenómeno de incêndio em meio urbano.
Em termos mundiais a National Fire ProtectionAssociation (NFPA) é a mais prestigiada referência em normas e regulamentos técnicos de Segurança contra Incêndio. A missão desta organização, sem fins lucrativos é a de redução das consequências a nível mundial dos efeitos dos incêndios sobre a qualidade de vida, fornecendo e defendendo consenso, códigos e normas, pesquisa, formação, e educação sobre esta matéria.2
Em Portugal, após um período alargado de produção legal em matéria de segurança contra incêndio, por vezes dúbio e também omisso na sua aplicação, regulamenta-se em 2008, um novo Regime Jurídico de Segurança contra Incêndios em Edifícios (RJSCIE). O RJSCIE, atualmente em vigor vem trazer alterações significativas em matéria de responsabilidades, funções e gestão das condições de segurança contra incêndio, que se refletem para as instalações já existentes, à data da sua publicação, na aplicação das chamadas medidas de autoproteção.3
Contudo, e, cada vez mais no nosso dia-a-dia, as alterações tecnológicas, a evolução técnica e as próprias alterações das condições ambientais, já constituem riscos com alguma probabilidade de ocorrência. Neste sentido o estudo das situações de emergência deverá também ele ser vocacionado para outro tipo de riscos emergentes que caracterizam os atuais tempos que se vivem.

A autoproteção e a gestão de segurança contra incêndios em edifícios e recintos, durante a exploração ou utilização dos mesmos, baseiam-se nas seguintes medidas, que variam em função da categoria de risco:
· Medidas preventivas - Estas medidas traduzem-se nos procedimentos de prevenção ou planos de prevenção;
·  Medidas de intervenção em caso de incêndio - Estas medidas tomam a forma de procedimentos de emergência ou de planos de emergência interno (PEI);
·  Registo de segurança – Nestes registos devem constar todos os relatórios de vistoria ou inspeção, e relação de todas as ações de manutenção e ocorrências direta ou indiretamente relacionadas com a SCIE;
·  Formação em SCIE - Sob a forma de ações de sensibilização e formação destinadas a todos os funcionários e colaboradores das entidades exploradoras, ou sob a forma de formação específica, destinada aos delegados de segurança e outros elementos que estão diretamente ligados à segurança e situações de maior risco de incêndio;
·  Simulacros – Apresentam-se sob a forma de exercícios, com o objetivo de testar o plano de emergência interno e treinar os ocupantes de forma a estes agirem conforme procedimentos de segurança apreendidos na formação em SCIE.
 
Fig.2 - Medidas de Autoproteção

As medidas de proteção correspondem ao conjunto de medidas adotadas no decorrer da construção de uma instalação e que são indispensáveis à atenuação do risco de incêndio, no caso do mesmo se verificar.
De acordo com Roberto e Castro (2010), é possível agrupar as medidas de proteção, de natureza física, regra geral, em:  
·         Disposições construtivas;
·         Segurança das instalações e equipamentos técnicos do edifício;
·         Sistemas e equipamentos de segurança. 4

As medidas de autoproteção dependem da Utilização-Tipo (UT) e categoria de risco de espaço:

Fig.3 - Medidas de autoproteção segundo a Utilização-Tipo (UT) e Categoria de Risco4
Ainda para Roberto e Castro (2010), estas medidas só surtirão efeito se por um lado, os utilizadores tiverem conhecimento das mesmas e as souberem utilizar e, por outro lado, se for garantida a sua manutenção e consequente operacionalidade ao longo do tempo.5
Esta ideia reforça a necessidade de que as medidas de proteção, só por si, não são suficientes, devendo ser também estabelecidas medidas preventivas com foco nos utilizadores das instalações. Ou seja, verifica-se atualmente que quem usufrui das instalações terá também um papel a desempenhar em situação de emergência, mesmo não estando diretamente envolvido na organização da emergência da instalação. Os comportamentos dos utilizadores não deverão constituir um risco, quer para os demais utilizadores, quer para a própria instalação.
É extremamente difícil, avaliar o impacto das medidas de autoproteção com base num estudo realizado apenas na fase inicial de implementação das medidas exigidas legalmente. Para se verificar o verdadeiro impacto das medidas de autoproteção, tem de se proceder a um acompanhamento e controlo regular mais alargado.

Até à próxima publicação!


Referências Bibiográficas:

3 - Decreto – Lei Nº 220/2008 de 12 de novembro - Estabelece o regime jurídico da segurança contra incêndios em edifícios. Diário da República, N.º 220 – I Série – Ministério da Administração Interna. Lisboa.
5 - Roberto, A. P., Castro, C. F. (2010). Manual de Exploração de Segurança Contra Incêndio em Edifícios. APSEI - Associação Portuguesa de Segurança Eletrónica e de Proteção Incêndio. Lisboa.

6 – Proteção Civil - GLOSSÁRIO DE PROTECÇÃO CIVIL - Autoria: SILVA, Miguel Correia da (Unidade de Previsão de Riscos e Alerta) / SANTOS, Alexandra e ANDERSON, Maria (Núcleo de Certificação e Fiscalização) 

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Vistoria a Cabeleireiros

A asma, problemas respiratórios e de pele, probabilidade de cancro na manipulação produtos cosméticos, distúrbios músculo-esqueléticos, stress relacionado ao trabalho... Um Cabeleireiro é uma ocupação predominantemente feminina, cerca de 87% de mulheres.


Caros leitores,
A semana passada fui fazer uma vistoria a um cabeleireiro, na procedência de uma avaliação de riscos aos trabalhadores. Após a vistoria realizei o relatório e deparei-me com diversos riscos associados à profissão, entre as quais vou mencionar algumas delas.
Fig.1 - Caricatura de Cabeleireiro.
O setor de cabeleireiro na Europa emprega mais de um milhão de pessoas com cerca de 400.000 salões de cabeleireiro e recebe cerca de 350 milhões de clientes. 
Uma visita a um salão de cabeleireiro é geralmente associada a um ambiente descontraído. No entanto, alguns clientes estão conscientes dos riscos associados à profissão de cabeleireiro. A Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho (EU-OSHA) reconheceu que os cabeleireiros estão expostos a riscos graves para a saúde ocupacional e que a melhoria das condições de trabalho deve ser uma prioridade principal 1. O custo das doenças de pele relacionadas ao trabalho foi estimado em cerca de cinco bilhões de euros por ano apenas nos UE. Um estudo do Reino Unido informou que 70% dos cabeleireiros sofreram de doenças de pele relacionadas com o trabalho. 2
Na profissão de cabeleireiro o Síndrome de uso excessivo Ocupacional (OOS) está presente em algumas partes do corpo, nomeadamente no pescoço, ombros, braços, mãos e pulsos. OOS é um termo coletivo para uma série de condições, incluindo lesões, tudo que é caracterizado pelo desconforto ou dor persistente nos músculos, tendões e outros tecidos moles.
Os primeiros sintomas de OOS incluem:
• desconforto muscular
• cansaço
• dor
• sensação quente e fria
• rigidez muscular
• dormência e formigamento
• rigidez
• fraqueza muscular.


Avaliação de Riscos
Fig.2 - Risco de entalamento e
queda ao mesmo nível
A avaliação de riscos é um processo previsto numa directiva-quadro da UE [Workplace Health and Safety Directiva (89/391/CEE)]. O empregador é obrigado a assegurar qualquer perigo para os trabalhadores, estes devem ser devidamente identificados e avaliados por técnicos especializados. Este processo envolve a aquisição de dados e compilação de um inventário de substâncias e produtos perigosos.
Fig.3 - Contacto com
substâncias químicas


No caso de produtos cosméticos, avisos e/ou instruções de uso no rótulo, este também irá fornecer informações valiosas. O inventário pode servir como base para a avaliação do perigo associada à atividade, a elaboração do procedimento operacional e da especificação de medidas de proteção no local de trabalho. Com base nas informações obtidas sobre os riscos das substâncias decorrentes dos produtos utilizados e do tipo e natureza das atividades previstas, por inalação, cutânea e físico-química, os perigos relacionados (riscos de incêndio e explosão) devem ser avaliadas de forma independente um do outro e compilados na avaliação dos perigos.
A ventilação adequada do salão de cabeleireiro é vital para minimizar a exposição. É importante que os produtos utilizados sejam projetados e fabricados em conformidade com o Regulamento da UE Cosmetics (Regulamento CE n º 1223/ 2009) e as instruções de uso devem ser seguidas. Algumas medidas básicas para a prevenção de exposição a produtos químicos são a verificação de que os recipientes devem ser imediatamente tapados após o uso, as embalagens vazias devem ser separadas de forma adequada e a armazenagem dos produtos devem estar em conformidade com o fabricante. Beber ou comer deve ser evitado, assim como o uso de jóias ou o uso de utensílios revestidos de níquel. Deve ser dado especial atenção ao uso de produtos químico, de forma a minimizar dermatites ocupacionais, deve-se reduzir o contato prolongado com a água, alternando entre as atividades de secos e molhados. As luvas de proteção devem ser usadas e os resíduos químicos na pele não devem permanecer por muito tempo. O creme também pode ser útil a este respeito.

Ergonomia


Fig.4 - Posturas incorretas

Trabalhar com o pescoço torcido ou dobrado para a frente ou para os lados longe demais (mais de 20 º) pode colocar pressão sobre os músculos do pescoço, especialmente se for repetitiva. Com o tempo, os músculos do pescoço e ombros podem apertar-se, resultando numa dor muscular crónica.
Na figura 4 podemos verificar que o trabalhador trabalha com as mãos ou os cotovelos acima dos ombros. O levantamento repetitivo e a realização contínua dos braços acima do nível do ombro sem apoio pode levar a tensão do pescoço, ombro, braço ou nas costas.3




  
Fig.5 - Punhos, mãos e dedos dobrados
Trabalhar com os punhos, mãos e dedos excessivamente dobrados em qualquer uma das direções indicadas na figura 5 são um problema, particularmente quando combinado com elevadas forças de mão e /ou repetitiva movimentos. Por exemplo, beliscar e segurar objetos não suportados (pinças, tesouras, secadores, ferros, etc) com alto vigor e realizando movimentos repetitivos são um risco.3

A Agência Internacional para Pesquisa sobre o Cancro (IARC) classificou a exposição ocupacional de produtos químicos de cabeleireiros e barbeiros como Grupo 2A, ou seja, provavelmente cancerígeno para o ser humano. Em 1993, segundo as conclusões da IARC baseados em estudos epidemiológicos, a incidência de cancro na bexiga nos cabeleireiros masculinos e barbeiros encontra-se entre 60% e 20%4

Outros estudos realizados pela IARC confirmam o aumento do risco de cancro entre cabeleireiros, mas os resultados não são totalmente consistentes. Os especialistas da IARC têm-se preocupado com a composição química de corantes capilares. Este estudo juntamente com uma monografia publicada em Abril de 2008 na revista “The Lancet Oncology” fazem referência à presença de tintas para o cabelo de várias aminas aromáticas e outros corantes cancerígenos. Relacionando assim o aumento significativo de cancro da bexiga observado nos trabalhadores de cabeleireiros e barbearias. 5
Um incidente no local de trabalho causa um prejuízo para o funcionário, não só tem um custo para a seguradora e o empregador, como também há custos sociais adicionais. O custo para a comunidade e os efeitos emocionais e psicológicos sobre os trabalhadores, bem como a família, não deve ser menosprezada ao calcular o impacto final da lesão. Muitas vezes, um empregado é incapaz de retomar um papel ativo na comunidade após um incidente no local de trabalho.
Os incidentes podem ser contestados de forma eficaz através da introdução de medidas que geralmente custam muito pouco. Por exemplo, o uso de luvas custa apenas cerca de 1 % do volume de negócios médio anual. A instalação de cadeiras giratórias reguláveis ​​em altura e o piso antiderrapante são também intervenções de baixo custo.

Até à próxima publicação!

Referências Bibliográficas:
1- AgênciaEuropeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho (EU-OSHA)- Avaliação de Riscos em Cabeleireiros
2 - Government of South Australia, Department of Health, Public health standards of practice for hairdressing, 2006.
3 - Saúde e Segurança nos Cabeleireiros 2013
4- World Health Organization and International Agency for Research on Cancer, Occupational exposures of hairdressers and barbers and personal use of hair colourants; some hair dyes, cosmetic colourants, industrial dyestuffs and aromatic amines, IARC Monographs on the Evaluation of Carcinogenic Risks to Humans, Vol. 57, 1997.
5 - The Lancet Oncology, vol. 9, n° 4, p. 322 - 323, April 2008.